fevereiro 28, 2018

O PESO DO MUNDO PRESSIONA AS MINHAS (as nossas) COSTELAS

Por: Febraro de Oliveira.
(sexta, dois de fevereiro em dois mil e dezoito, 14h:36min)




Esse artigo é quase uma carta. É um segredo secreto universal e intransferível. O que escrevo é apenas seu. E meu. Este é um bom ponto para começarmos.

Quando nasci, eu já não era eu. Meu corpo, minha “essência”, minha alma, meu qualquer coisa, já não era meu, era seu. Agora é mais óbvio: em um grupo de teatro, em um grupo, a angústia individual e egoísta serve para pouca coisa – ou nada. Nada. Eu luto contra isso todos os dias. 

Eu me chamo Vinícius Febraro de Oliveira. E foi aí que começou o problema. Quando eu era criança, meus pais me falaram que o nome Vinícius vinha de Vinicius de Moraes, chorei tanto neste dia que minha mãe teve que mentir. Isso já explica muita coisa, grande companheiro. 

Agora sobre esse mês que se passou:

Janeiro. Morri em Janeiro. Agora tenho que nascer, mas como se faz um parto se o mundo pressiona o útero? Este é um bom ponto para começarmos. Já preferi andar sozinho. Hoje é impossível andar, ou ser, sozinho. E digo hoje porque não vivi o passado da minha vida. Antes de existir, eu era uma célula, um átomo, um pedregulho, qualquer coisa que o universo quis manter. Tenho os meus segredos e eles me guardam a solidão, mas caio na minha ratoeira: quando o espectador vê a obra com olhos de ver, ele vê o artista nu e sem segredos? Eu sou honesto com o espectador e comigo? A solidão do artista e do espectador, quando se encontram, muda o mundo? Continuarei sem saber. Continuarei caminhando com você. Seguimos.

Tenho dezenove anos, já me casei. Estou agora em meu segundo casamento. Os dois em um grupo de teatro, os dois uma grande imersão, os dois um grande desespero, os dois um grande amor, os dois um grande oceano sem começo nem fim. Se casar em um grupo de teatro. Deve existir dor maior que a de estar casado em um grupo de teatro, deve existir solidão maior, mundo maior, medo maior, mas não conheço. Ainda. 

O que acontece quando um casamento acaba em um grupo de teatro? Pelo que notei, ele não acaba. Você continua vivendo vinte e quatro horas com essa pessoa. A convivência cotidiana continua. O amor, admiração, respeito e carinho também. Ou deveria. Quando meu primeiro casamento acabou, eu pensei que fosse morrer. Agora até tiro risada disso. A vida continua e, pelo que parece, o amor vive na porta ao lado.

A maldade sempre me assustou. Tudo vazio de nós. Foi criado um pequeno rebu. Este mês vi dois grandes amigos, amores, companheiros me maltratando, sendo malvados. Somos jovens e só sabemos nos defender e atacar. A internet nos permitiu esquecer que nos amamos.  Quando li as mensagens chorei, tive febre e dor de garganta. Mas não se preocupe grande companheiro, essa dor é eterna e nós nos salvamos. Ainda choro. O amor é uma coisa mais profunda que isso. E eu os amo.

Este mês meu primeiro marido, Samuel, foi embora do grupo. Parece que agora o casamento acabou. Parece que só assim acaba um casamento em um grupo de teatro. Tenha uma ótima vida. Adeus, amor, adeus. 

Caminho pelas garrafas, bitucas, mortes, crianças, medo, viagens e contas. Nesse caos, encontrei o amor. Me casei pela segunda vez. E parece que o grande amor estava na porta ao lado. Como me disseram antes. Embaixo do nariz de palhaço, há um coração pulsando. Que não seja imortal, posto que é chama. Mas que seja eterno enquanto dure. Que venham os orixás, os búzios, as cartas, as mãos, os tabloides, os evangelhos, os signos. Que sejamos felizes embora seja necessário sofrer. Isso é o teatro do mundo. 

Agora sobre a minha solidão com as crianças:

Voltaram as aulas de teatro para crianças. É difícil, cada vez mais difícil. Será que ainda levo jeito? O tempo dirá. Só o tempo. Surfaremos no caos. Ah, claro, quase esqueci: fiz um cronograma do primeiro semestre do ano. A luta do artista consciente que trilha um Lá que é desconhecido e, ao mesmo tempo, mutável. Damos um passo, e o Lá dá três passos. Dou um passo para chegar à criança que faz teatro, e ela dá outro. É impossível isso. Caminhamos para os monólogos autobiográficos e o porquê das guerras. Você está convidado. Temos muito trabalho pela frente.

É necessário ter saúde. Ás vezes nos esquecemos disso. Ontem, por exemplo, trabalhamos das sete da manhã até às dez da noite. Martelamos, limpamos, corremos, pagamos contas, fizemos cálculos, planilhas, dramaturgias, poesia, e fomos ao mercado. Isso é a rotina de um grupo de teatro. Aleatória, mutável e incompreensível para quem não o vive. Prometemos trabalhar menos em dois mil e dezoito. É, eu sei.

Os meus diretores, pais, amantes, amigos e companheiros Ligia e Fernando estão cansados. Prometo cuidar deles não dando mais trabalho, não sendo ingrato. A gratidão vem do amor e do carinho, não tenho nenhum talento, só amor e carinho. Parece que em janeiro o mundo pressionou nossas costelas sem medo. Me dedicarei aos outros onze meses com bastante amor e cuidado. Se cuidem, grandes amigos. 

Sobreviveremos, viveremos e amaremos até o último segundo, grande companheiro. Sigamos juntos para não nos esquecermos.


com amor e carinho,
seu,
Febraro.



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