dezembro 02, 2017

JURO SOLENEMENTE QUE SÓ COMPRAMOS COLA QUENTE

Por: Samuel Alejandro, Gabriel Brito e Kelly Figueiredo.


Nós corremos contra o tempo. Todos os doze.  O artigo é de nós três. Kelly. Gabriel. Samuel. Nomes curtos e sem sobrenomes para economizar tempo. Preciso puxar esse curativo com rapidez para que a dor não atrapalhe tanto. Eu, Kelly, não tenho afinidade com a escrita. Eu, Samuel, vou tentar te seduzir. Eu, Gabriel, enlouquecido e acadêmico. Rápido. Somos três cabeças no ateliê. Um ateliê que pensa sobre a cabeça dos outros. Que chapéu cabe na cabeça dos outros? Que cor tem uma bruxa? Deixa eu medir a circunferência da sua cabeça para que a máscara caiba em você também. Pintamos caixotes, juntamos pincéis e demos o nome de ateliê. Se esse nome cabe ao espaço que dividimos com os cachorros, não sei. Não devo saber de nada tão cedo. Não tem tempo. É fazer acontecer. O mês fez acontecer essa equipe. E veio do sangue no olho, a vontade de criar. De pulsar. Virou a chave. O que eu fizer tem de ser meu ponto de concentração e a criação da minha vida. Veio A Bela Adormecida, O Sítio do Picapau Amarelo, Chapeuzinho Vermelho, O Mágico de Oz, A Bela e a Fera, A Branca de Neve.  Tudo parte do entendimento de quem cria o mundo que se vive em cena. Que se cria a saia de uma princesa que será usada por você ou vista por você. Tudo é contato. O entendimento de que o mundo tem um dedo seu. Da sua cola quente. Da sua ideia. Do Pinterest. Da placa de “Lar Doce Lar” da casa. Do jornal. Da sua roupa antiga que estragou e virou tecido pra uso. Tudo tá cheio de dedo. Tudo é referência. 

Juro solenemente que só compramos cola quente. O resto já existe. Achei na rua. No depósito. No seu guarda-roupa. No armário de tapetes. Se tudo já existe, tudo pode ser usado em tudo. Reaproveitado. Reciclável. Mas ainda assim, permanecemos mal perante ao meio ambiente. Usamos muito spray de cabelo. Faz mal. Mas é outra história. Nossa história é essa da companhia de teatro. Nunca ouvi falar, só sei o que é porque tenho uma.  É sobre ciência. É um artigo. O primeiro de nossas vidas. Com 18, 19 e 39 anos. O tal choque das gerações. A lógica trabalha em entender o espetáculo antes do espetáculo, o espetáculo como conceito, como atmosfera, o personagem como presentificação, o que combina com ele, o que limpa e o que suja. Falta cor? Tem tecido. Não tem tinta? Tinge com café. Ninguém usa esse vestido? Traz pra mesa. Tem jornal? Tem jornal. Para trabalhar como o Grupo Casa, sem tempo e sem dinheiro, é preciso ter olho bom, ouvido aberto, nariz que cheira. Todo o necessário está em casa ou muito perto. Nosso depósito é um fenômeno de recurso inesgotável. Sempre aparece mais tecido. Caixa de papelão. Livro velho de advocacia com página bonita. Ferro de cortina. Tudo é tão tentador pra misturar e transformar. Quando acabar, começamos a usar os tijolos. 

“A cenografia é um produto que só uma vez será usado, usado para um e um só espetáculo. Não importa se este permanecerá em cartaz um ano ou cem. Num determinado momento, tudo terminou e do que aconteceu somente sobreviverá a vaga, e cada vez mais vaga, lembrança de algo que foi belo como um amor antigo do qual somente sobrou uma foto esmaecida, o desenho de um gesto no espaço, a entonação de um adeus, a vaga rememoração de um som, de uma luz, de um consenso.”

De Gianni Ratto, “Antitratado de cenografia”, 1999. O que entendo por isso? A parte do amor antigo. Só sei achar e achar. Acho que acabamos. Acabamos, eu, Kelly, eu, Samuel, eu, Gabriel. Todos com adjetivos que não vem ao caso. Cientistas. De cabelo bagunçado e jaleco. Como pode um peixe vivo viver fora d’água fria? Vou descobrir.

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