janeiro 04, 2018

FINALMENTE UM SURDO NA PLATEIA!

Por: Roberto Lima.



O que é ser um intérprete de libras dentro do mundo cênico? É uma pergunta difícil de responder. Não sou o mesmo de tempos atrás, quando comecei a aprender essa língua. Não sou o mesmo de dois anos atrás quando entrei no teatro, menos ainda de seis meses atrás quando a escola me consumia 40 horas do meu tempo, e com certeza não sou o mesmo de dois dias atrás, quando o Coringa teve seu primeiro expectador surdo depois de dois anos de espetáculos! E a mágica está em confessar que o milagre aconteceu em nossas férias, no estado do Espírito Santo, Brejetuba, na fazenda Leogildo. Esse fato trouxe de volta questões que me consomem intrinsecamente! Voltei a debater com nossos diretores a respeito! O que é realmente a inclusão e qual a melhor forma de fazê-la? Manter o intérprete em uma lateral qualquer da cena e fazer o público surdo escolher entre peça e sinalização? Pôr o intérprete dentro de cena para acabar essa disputa? Tornar o intérprete uma personagem da história? Qual a melhor solução? Manter diálogos paralelos com o público surdo e tornar a tradução em si um segundo plano? Esquecer os demais integrantes? A complicação entre dividir sua atenção entre um público específico e reduzido dentro de um montante de outras pessoas e aos demais integrantes do coletivo, perceber a cena e sua movimentação, o desenrolar da história e sua posição diante dela. Um violão que cai e alguém precisa pegar. O violão que eu, intérprete, estava tocando em cena, agarrado às minhas costas que cai e alguém precisa pegar...  A dúvida do que é mais importante. Qual elemento prevalece? A sinalização? A música? A cena? Que elemento prevalece? O todo, o conjunto da obra deve se elevar igualmente! Entendi! Não se pode preservar mais o azul e dar menos importância ao rosa! Enfim, ter um espectador surdo na plateia, alguém que eu pudesse dirigir a fala sinalizada, fez toda uma diferença na minha cabeça. Ele, Guilherme, o espectador surdo, de 12 anos de idade, não tem consciência do quanto me fez sentir que preciso melhorar! Preciso estudar mais e entender sobre minhas limitações e paradigmas mentais! Não sou o mesmo de dois dias atrás e espero estar em constante mudança a favor dessa construção que nos dispusemos a principiar.

Há alguns dias eu decidi que queria muito ter um nome pra essa junção de ator e intérprete! Algo que pudesse me definir quando alguém me questionasse sobre qual trabalho desenvolvo... A sigla para intérprete de libras é TILS, e experimentei colocar a letra “A”, de ator, no meio dela pra ver como ficava: TAILS, TIALS, TILAS, TILSA... Nenhuma ornava, foi bem triste! Até que entendi uma coisa: todo intérprete precisa ser um pouco ator, mas nem todo ator é intérprete... Então a ordem deveria ser Ator/Intérprete, e não Intérprete/Ator, e assim a sigla veio! ATILS ou A-TILS (Ator Tradutor Intérprete de Libras). Termino o ano com um pouco mais de identidade e entendimento sobre a causa que me causa. Entendendo ainda que o inicio está acontecendo, finalmente um surdo na plateia! Vamos continuar insistindo na acessibilidade. E buscar as saídas possíveis para que ela seja verdadeira. 

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